quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Nobel da Literatura 2014

Nobel da Literatura 2014 distingue francês Patrick Modiano


"No Café da Juventude Perdida", de 2007, e "O Horizonte", de 2010, são obras de Patrick Modiano já  publicadas em Portugal.

 Patrick Modiano com a cantora e compositora Françoise Hardy, 1969, no Bois de Bologne (Paris)

Imagens do romancista publicadas no sítio Babelio




 "Durante seis meses, deslocou-se regularmente a casa de Simone Cordier para lhe remeter novas páginas e recuperar as já dactilografadas. Por precaução, pedira-lhe que conservasse em sua casa as folhas manuscritas.
- Receia alguma coisa?
Lembrava-se perfeitamente de que, certa noite, a mulher lhe fizera esta pergunta, fixando-o com um olhar surpreendido e ao mesmo tempo benevolente. Naquele tempo, a inquietação devia transparecer no seu rosto, na maneira de falar, de caminhar e mesmo de se sentar. Apoiava-se sempre no rebordo das cadeiras ou das poltronas, apenas com uma nádega, como se não se sentisse realmente no seu lugar e se preparasse para fugir. Por vezes, esta atitude surpreendia num jovem de estatura elevada e cem quilos de peso. Diziam-lhe: “Está mal sentado… Descontraia-se… Ponha-se à vontade…”, mas era mais forte do que ele. Exibia frequentemente um ar de quem se desculpa. De quê, afinal? Era a pergunta que muitas vezes fazia a si próprio quando caminhava sozinho pelas ruas. Desculpar-se de quê, hein? De viver? E não conseguia evitar uma sonora gargalhada que levava os transeuntes a voltarem-se para trás."
 
Patrick Modiano, O Horizonte (2011)
Crítica do Livro
Rostos, episódios breves, encontros singulares.
Tudo isto começara como que a vir ao de cima na memória de Jean Bosmans. Chegavam de um passado longínquo, do tempo da sua juventude, de há 40 anos atrás. "E, se todas as palavras ficassem suspensas no ar até ao fim dos tempos e bastasse um pouco de silêncio e de atenção para captar os seus ecos?"


"Quando entrei no Condé, os ponteiros do relógio redondo da parede do fundo marcavam exactamente cinco horas. Em geral, ali, é uma hora morta. As mesas estavam livres, excepto a que se situava ao lado da porta, à qual se sentavam Zacharias, Annet e Jean-Michel. Olharam-me de uma maneira estranha. Não disseram nada. Os rostos de Zacharias e Annet estavam lívidos, com certeza por causa da luz que entrava pela janela. Não responderam quando lhes disse bom-dia. Fixaram-me daquela maneira estranha, como se eu tivesse feito algum mal. Os lábios de Jean-Michel contraíram-se e senti que queria falar comigo. Uma mosca pousou nas costas da mão de Zacaharias e ele enxotou-a com um gesto nervoso. Depois pegou no copo e bebeu o conteúdo de um trago. Levantou-se e avançou em direcção a mim."
Patrick Modiano, No Café da Juventude Perdida (2007)

 Crítica
Retrato melancólico da boémia parisiense dos anos 60 num livro sobre a perda e o poder magnético dos lugares.
"No Café da Juventude Perdida", a mais recente ficção de Patrick Modiano (editada pela Gallimard em 2007), pertence a uma das mais antigas e persistentes linhagens da literatura francesa: o romance parisiense que toma como protagonista a própria cidade de Paris - com as suas ruas e atmosferas, o seu esplendor ou o seu mal de vivre.

«O escritor francês Patrick Modiano é o galardoado com o Prémio Nobel da Literatura 2014, foi hoje anunciado pelo Comité do Nobel.
A Real Academia de Artes Sueca jutifica sucintamente a decisão: "Pela arte da memória com que ele evocou o mais incompreensível dos destinos humanos e pôs a descoberto da vida no mundo da ocupação".
Patrick Modiano nasceu em Boulogne-Billancourt, nos arredores de Paris, em Julho de 1945, e publicou o seu primeiro romance, La Place de l'Étoile, em 1968. Com Rue des boutiques obscures obteve, em 1978, o Prémio Goncourt. Em 1972, recebeu o Grande Prémio de Romance da Academia Francesa.
Considerado um dos mais importantes escritores franceses, e autor de uma vasta obra, Modiano foi distinguido recentemente com o Grande Prémio Nacional das Letras e com o Prémio Margerite-Duras.
O galardão será entregue numa cerimónia em Estocolmo, a 10 de dezembro, dia do aniversário do industrial Alfred Nobel, que instituiu o galardão.
O ano passado a vencedora foi a canadiana Alice Munro. José Saramago foi o único autor de língua portuguesa a ganhar o prémio Nobel da Literatura, em 1998. »


Fonte:VISÃO, 9 de outubro de 2014