sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Aspeto Verbal

Imagem do filme de João Botelho Quem és tu?

Maria morre nos braços de seus pais.


Como vimos em aula, OS VERBOS são muitíssimo importantes na criação de toda a ação dramática de Frei Luís de Sousa, de Almeida Garrett.

OS TEMPOS VERBAIS definem por si só muitos dos sentidos e da tensão dramática, de acordo com os exemplos estudados, como nos casos:

"É a minha única filha: não tenho...nunca tivemos outra" (cena II, ato I) - a mudança de tempo e de pessoa são muito significativos.

"Que fazes? Que fizeste?" (final do 1º ato) - a mudança de tempo traduz a constatação de uma impotência face a um ato irreversível.

Mas, como se referiu - e se observa neste último exemplo - , não só a categoria do TEMPO é relevante na forma de trabalhar os verbos. Repara que D. Madalena ao fazer aquela pergunta - Que fizeste ? apresenta o ato de incendiar a casa como processo completo, terminado no momento da enunciação.

Vamos pois, relembrar a categoria do ASPETO VERBAL, enumerando o tipo, a sua explicação e exemplos.

Ao registares no caderno, acrescenta aos vários exemplos dados pelo menos mais um ou dois exemplos retirados da peça.
ASPECTO
EXPLICAÇÃO
EXEMPLO

IMPERFETIVO
Refere um processo em realização, inacabado.
Valor aspectual de um enunciado que representa uma atividade, um estado ou um evento prolongado, construídos como homogéneos, quer estejam em curso (ex.1) ou não (ex.2 e 3).
A duração das situações imperfectivas pode ser determinada por locuções adverbiais durativas (ex.2 e 3).
O imperfectivo pode combinar-se com os valores temporais de simultaneidade (ex.1 e 4), anterioridade (ex.2 e 6) e posterioridade (ex.3 e 5).
Em (1), (2), (3) e (5), o ponto de referência identifica-se com o tempo da enunciação.
Em (4) o ponto de referência,  é expresso linguisticamente pela locução adverbial temporal proposicional quando a vi.
Estudo numa capital europeia.
(1) A Maria está a ler o livro.
(2) A Maria leu durante duas horas.
(3) Esta tarde, a Maria vai nadar até ao pôr do Sol.
(4) A Maria estava a ler um livro quando a vi.
(5) A Maria vai estudar com o João.
(6) A Maria leu em 15 dias.

PERFETIVO
Apresenta um processo completo, terminado no momento da enunciação.
Diz-se que um enunciado tem valor aspectual perfectivo quando representa um evento construído como um todo completo a partir de um ponto de referência que lhe é exterior. Por esta razão, o perfectivo pode combinar-se com os valores temporais de anterioridade e de posterioridade mas não de simultaneidade.
O pretérito perfeito simples e as formas de futuro são geralmente marcadores linguísticos de valor perfectivo quando se combinam com eventos instantâneos e com eventos prolongados.
O valor perfectivo é compatível com locuções adverbiais de completamento - da forma 'em x tempo' - em duas horas (ex.4), mas não com locuções adverbiais durativas homogéneas da forma 'durante x tempo' - durante duas horas (ex.5).
Este último exemplo mostra que, ao concorrer com uma locução adverbial durativa, o valor aspectual que, em (1), é perfectivo passa a ser imperfectivo
(1) A Maria leu o livro. implica O livro está lido.
(2) A Maria vai ler o livro esta tarde. implica O livro vai estar lido esta tarde.
(3) A Maria desmaiou. implica A Maria está desmaiada.
(4) A Maria leu o livro em duas horas. implica o livro está lido
(5) A Maria leu um livro durante duas horas.
(o livro ainda não está lido)

GENÉRICO
Diz-se que um enunciado tem valor genérico quando refere uma pluralidade infinita de situações, construídas como atemporais e verdadeiras em toda e qualquer situação de enunciação.
O verbo ocorre geralmente no presente do indicativo, designado, nestes casos, por presente genérico.
As expressões nominais sobre as quais incide a predicação são interpretadas referencialmente como classes e não como indivíduos específicos (ex.1 a 5).
Em (4), a 2ª pessoa do singular pode ter interpretação genérica.
O enunciado (5) exemplifica uma relativa genérica.
O enunciado genérico exprime igualmente definições e outras propriedades universais nos diversos domínios da ciência (ex.6).
(1) O homem é mortal
(2) Um homem não chora
(3) Homem prevenido vale por dois
(4) Se queres a paz, prepara a guerra
(5) Quem cala consente
(6) Dois e dois são quatro

HABITUAL
Diz-se que um enunciado tem valor habitual quando refere uma pluralidade teoricamente infinita de situações que se sucedem durante um período construído como ilimitado. Corresponde geralmente à predicação de uma propriedade sobre um indivíduo ou um grupo de indivíduos.
A pluralidade de situações construídas pode ter como ponto de referência o tempo da enunciação e, nesse caso, o verbo ocorre no presente do indicativo (ex.1 e 2);
pode ter como ponto de referência uma coordenada temporal distinta do tempo da enunciação e, nesse caso, o verbo ocorre no pretérito imperfeito do indicativo (ex.3 e 4).
O valor habitual combina-se frequentemente com o valor iterativo.
O valor habitual é um valor aspectual imperfectivo.
(1) O João joga futebol aos domingos.
(2) Os irmãos do João costumam almoçar na escola.
(3) O João almoçava na escola quando estava no ciclo.
(4) O pai do João costumava fumar um charuto depois do jantar.

PONTUAL
Indica um processo que dura apenas um instante.
O aspeto pontual pode ser expresso pelo conteúdo lexical ou por advérbios ou locuções adverbiais.
O aspeto pontual só é compatível com o aspeto imperfetivo quando o enunciado tem valor iterativo (ex.2 e 3).
Em (3), o valor iterativo é indissociável da interpretação distributiva do grupo nominal soldados.
O rapaz desmaiou na escola. (pretérito perfeito + conteúdo lexical)
A bomba explodiu. (pretérito perfeito + conteúdo lexical)
O Carlos caiu. (pretérito perfeito + conteúdo lexical)
Repentinamente falou. (adverbio)
(1) A Maria chegou às duas horas.
(2) A Maria chega sempre atrasada à aula das oito.
(3) Chegaram soldados durante horas.

DURATIVO
Exprime uma ação que perdura no tempo.
O aspeto durativo pode ser expresso pelo tempo, por uma perifrástica, pela repetição do verbo ou por advérbios ou locuções adverbiais
As situações durativas são delimitadas intrinsecamente - no caso dos eventos prolongados (ex 1) - e são delimitáveis extrinsecamente - no caso dos estados (ex 2) e das atividades (ex 3).
Ele dorme profundamente. (presente)
Está a dormir. (conjugação perifrástica)
Ele esperava ansiosamente notícias. (pretérito imperfeito)
Ele tem treinado muito. (conjugação perifrástica)
O João vai jogar toda a tarde. (conjugação perifrástica)
Voava, voava. (repetição da mesma forma verbal)
A pouco e pouco esqueceu os desgostos. (locução adverbial)
(1) O João vai ler um romance policial esta tarde.
(2) O João teve uma casa na praia durante as férias.
(3) O João jogou no Benfica na época passada.

ITERATIVO
Exprime uma ação que se repete.
O aspeto iterativo pode ser expresso:
-  pelo tempo (pretérito imperfeito ou pretérito perfeito composto),
- por uma perifrástica,
- por sufixo ou
- por locuções adverbiais.
Um enunciado tem valor iterativo quando refere uma pluralidade de situações eventivas   (eventos) que se repetem regularmente durante um período de tempo delimitado (ex.1e 2) ou não delimitado (ex. 3 e 4).

Quando a iteração é teoricamente ilimitada, podem confundir-se o valores iterativo e habitual (ex. 3 e 4).
Em (1) e (4), é a locução adverbial frequencial todas as semanas que permite a interpretação iterativa do enunciado.

Em português, o tempo verbal pretérito perfeito composto exprime, por si só, o valor iterativo (ex.5).

O termo 'iterativo' também pode designar uma característica inerente a situações que são  atividades (ex.6).
Ela mordiscava os lábios (pretérito imperfeito)
Os touros foram espicaçados. (pretérito perfeito composto)
Eles têm ido à praia todos os dias. (perifrástica + locução adverbial)
Tomo duche todos os dias. (locução adverbial)
Ela saltita o dia todo. (sufixo e locução adverbial)
(1) O ano passado, o João foi ao cinema todas as semanas.
(2) chegaram soldados durante a manhã.
(3) Quando era estudante, o João ia ao cinema todas as semanas
(4) O João vai ao cinema todas as semanas.
(5) O João tem ido ao cinema.
(6) Correu durante uma hora

Créditos: Prof2000, http://www.prof2000.pt/users/dani/verbos/aspecto.htm, consultado em 2 de fevereiro de 2012.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Discurso e força ilocutória



A forma como Almeida Garrett domina  a linguagem, a mestria com que escolhe as palavras, manobra os verbos, recorre à pontuação fazem de FLS uma peça que lemos sem qualquer dificuldade, seguindo com interesse e emoção as falas das personages, gente que diante de nós se revela - em palavras de carne e osso.







Para percebermos melhor como estes processos linguísticos se estabelecem, vamos rever ou aprender alguma informação.

Lê, regista os apontamentos no Caderno Diário e consulta a tua gramática sobre esta matéria. Verifica se há diferenças, regista outros exemplos, prepara-te para a reflexão e esclarecimento de dúvidas em aula.

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No texto dramático/TEATRO:
Um texto teatral é uma obra literária específica para o teatro, contém os diálogos e as indicações de cena.
Sozinho, o texto é apenas literário dramático, transformando-se em teatro quando encenado.

O diálogo é a parte reveladora das personagens. Um personagem pode falar com outro personagem em cena, diretamente ao espectador e até consigo mesmo. As possibilidades de diálogo são:
- Réplicas - discurso puro do personagem que se exprime;
-Aparte ou Solilóquio: réplica em que um personagem fala para si mesmo, simulando não ser ouvida pelos outros personagens. É como um pensamento em voz alta que é ouvido apenas pelo público;
- Monólogo: encadeamento de réplicas partilhando pensamentos e sentimentos de um personagem
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DISCURSO
O discurso é um produto da interacção locutor/interlocutor:  aparece contextualizado no espaço e no tempo, envolvendo uma componente linguística e elementos extralinguísticos:
- o estatuto social (ex. o nível social das personagens de FLS)
- as relações interpessoais (ex. as relações de familiaridade entre a família; o caso particular de Telmo)
- os aspectos culturais da sociedade a que pertencem
- o saber compartilhado (ex. o passado que une Telmo a D. Madalena dá-lhe uma familiaridade no trato fora do comum, embora as formas de tratamento usadas continuem a preservar a necessária distância social)
Quem és Tu?
Relembra:
A mesma frase pode assumir diferentes valores. Assim:
a) Telmo pensa em Maria. - O falante faz uma asserção.
b) Telmo pensa em Maria? - O falante faz uma pergunta.
c) Telmo, pensa em Maria! - O falante faz um pedido ou uma ordem.


Força ilocutória
A força ilocutória corresponde ao conteúdo significativo que permite ao interlocutor o reconhecimento do objectivo comunicativo do locutor, num contexto específico de enunciação.
"(...) desde o tempo que...que..." (D. Madalena)/"Que já lá vai, que era outro tempo." (Telmo)
"Parti! Parti!"
"Fujamos, fujamos..."

Num enunciado, a força ilocutária aparece marcada por: 
     1) a ordem das palavras

2) a entoação,

3) a pontuação

4) o modo do verbo

5) os verbos performativos (que concitam ações - ordenar, perguntar...)

O tipo de acto ilocutário pode ainda ser determinado, começando a frase por:

Aviso que
Prometo que
Peço que
Afirmo que

Muitas vezes não se torna necessária a utilização de verbos performativos (estes exprimem ações contratuais como prometer, declarar, aconselhar, ordenar, perguntar...) para a determinação da força ilocutária, uma vez que, perante a situação enunciativa, o interlocutor (ou ouvinte) é capaz de interpretar correctamente o discurso.
Ex: "Está bom, não entremos com os teus agouros (...) Deixemo-nos de futuros" (D. Madalena para Telmo. Percebemos que se trata de uma ordem/um pedido, correspondente a: aconselho-lhe-te a que ...)