quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023

Amor de Perdição o amor e a sociedade

Camilo Castelo Branco, Amor de Perdição | Câmara Municipal de Guimarães      Amor de Perdição 

 «O AMOR-PAIXÃO

• A apologia da liberdade individual feita pelo Romantismo, associada à valorização do amor — visto como um dos sentimentos mais importantes (senão o mais
importante) na vida do Homem — leva o amor-paixão a ser um dos temas
centrais das obras deste movimento.


• É efetivamente isto o que sucede em Amor de perdição: como foi referido anteriormente,
o narrador assume uma posição subjetiva — salientando o carácter
absurdo do ódio entre as duas famílias, bem como a injustiça que está subjacente
às tentativas, por parte de Tadeu de Albuquerque, de impor à sua filha
um casamento com um homem que ela não amava, e que a condenaria a ser
infeliz para todo o sempre. Em contrapartida, é louvado o carácter heroico de
Teresa e de Simão, que, tendo consciência da dimensão sublime da sua paixão,
estão dispostos a abdicar da liberdade e, posteriormente, até da própria
vida, em seu nome. A morte não os intimida, dado que ambos encaram o amor
como um sentimento ideal, que, caso não possa ser vivido na Terra, será concretizado
no Céu. Com efeito, ambos estão seguros do carácter eterno da sua
paixão, que não se coaduna com a mesquinhez de uma sociedade movida por
valores meramente terrenos.


• O amor-paixão é também vivido por Mariana, na medida em que, como foi
anteriormente referido, apesar de ter consciência de que o seu sentimento não
é correspondido, acabará por dedicar toda a sua vida a Simão. Contudo,
ao contrário dos protagonistas, esta personagem, pelo seu carácter prático, ao
invés de projetar na eternidade a esperança de ser amada por Simão, tem esperança
de ser correspondida ao acompanhá-lo no exílio. O pragmatismo não
torna, no entanto, o seu amor inferior ao de Teresa: sabe que a sua vida não faz
sentido sem o amado e diz friamente que, caso este morra, se suicidará — o
que efetivamente acaba por suceder.» 

Amor de Perdição | Coisas para fazer in Lisboa

«A OBRA COMO CRÓNICA DA MUDANÇA SOCIAL


• Se o Amor é o tema central de Amor de perdição — e se concretiza na forma
de ideal do amor ou de amor contrariado —, outros temas e questões sociais
ganham especial relevância na novela, como a noção de honra, as falsas virtudes
ou a condição da mulher no início do século XIX.


• Na verdade, Amor de perdição assume-se como uma crónica da vida em sociedade
e dos costumes desta época de mudança social e política na transição do
Antigo Regime (Absolutismo) para a Época Moderna do Liberalismo.
Na narrativa encontramos dois sistemas de valores, ideias e entendimentos
do mundo em confronto: por um lado, as noções de honra, de privilégio das
classes sociais dominantes, de autoridade familiar e de (falsa) virtude cristã,
associados ao Antigo Regime; e, por outro, os valores de liberdade, igualdade,
justiça social, que o Liberalismo e o Romantismo vêm reivindicar.


• As questões sociais são analisadas de forma crítica em Amor de perdição.
O narrador denuncia e satiriza os valores caducos da sociedade antiga (isto é,
anterior à Revolução Liberal) e os comportamentos sociais condenáveis —
sobretudo da velha nobreza e do clero —, tais como a falência da justiça,
as práticas dos membros da Igreja (recordem-se as freiras do convento onde
Teresa é encerrada), a noção de autoridade paterna (de Domingos Botelho e
de Tadeu de Albuquerque), cujas contradições são expostas perante os olhos
do leitor.


• De facto, Amor de perdição é bem uma obra que, sendo romântica — veja-se
a forma como se expressam as emoções e como se veiculam os valores do
Liberalismo —, anuncia já a narrativa da atualidade (Buescu, 1997: 344-350),
na medida em que estuda e critica a sociedade do seu tempo, ainda que
a ação se circunscreva ao início do século XIX e a uma região do Norte do País.»

Fonte: Recurso educativo da editora Santillana,AMOR DE PERDIÇÃO, de CAMILO CASTELO BRANCO, https://www.santillana.pt

Imagens - 2 fotogramas do filme Amor de Perdição, de Manoel de Oliveira, 1979

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