Recorda os poemas trabalhados na ficha sobre a lírica de Camões. Lembra estes excertos:
"Nos seus olhos belos
tanto Amor se atreve
que abrasa entre a neve
quantos ousam vê-los.
Não solta os cabelos
Aurora mais bela:
perco-me por ela."
tanto Amor se atreve
que abrasa entre a neve
quantos ousam vê-los.
Não solta os cabelos
Aurora mais bela:
perco-me por ela."
"Se imaginando só tanta beleza,
De si com nova glória a alma se esquece,
Que será quando a vir? Ah quem a visse!"
«Os termos
Amor, Beleza e Mulher, dentre outros, são grafados nos sonetos de Camões com
inicial maiúscula, pois expressam o ideal absolutista desses conceitos que o
poeta buscava alcançar. O que Camões pregava não era um amor a uma mulher qualquer, mas o amor à Mulher ideal que carrega em si toda universalidade do
conceito de Beleza, de Perfeição. Da mesma forma o poeta busca descrever o
Amor, não um amor necessariamente vivido, mas um Amor idealizado, desejado e
que expresse um sentimento absoluto, superior. Analisemos um conhecido soneto
de Camões:
“Amor é fogo que arde sem se ver;/ É
ferida que dói e não se sente;/ É um contentamento descontente;/ É dor que
desatina sem doer;”.
Como vemos, o Amor consiste num
sentimento tão amplo que não se pode [definir], e por isso o poeta faz uso de
várias antíteses e paradoxos para tentar descrevê-lo. Ao fazê-lo busca passar a
ideia de um conceito, de um pensamento absoluto sobre o amor, mais do que
expressar um sentimento íntimo, subjetivo. Ao mesmo tempo em que busca alcançar
esse ideal Racionalista, Camões, ao usar as antíteses e paradoxos, expressa o
Amor como um sentimento contraditório.»
«Camões descrevia a
Mulher como um ser dotado de beleza
tal que era vista como uma deusa, como
um ser sobrenatural que não devia ser desejada
fisicamente, mas amada e idolatrada como um ser superior capaz de dar vida às coisas a sua volta só com sua beleza. Essa
Mulher servia de foco para onde o homem devia destinar
todo aquele Amor supremo e idealizado
pelo qual vivia. Vejamos um
outro soneto no qual Camões
fala dessa adoração:
O lindo ser de vossos olhos belos,
Se não perder a vista só com vê-los,
Já não paga o que deve a vosso gesto.
Este me
parecia preço honesto;
Mas eu,
por de vantagem merecê-los,
Dei mais a
vida e alma por querê-los,
Donde já
me não fica mais de resto.
Assim que
a vida e alma e esperança,
E tudo
quanto tenho tudo é vosso;
E o
proveito disso eu só o levo.
Porque é
tamanha bem-aventurança
O dar-vos
quanto tenho e quanto posso,
Que quanto
mais vos pago, mais vos devo.
Ora, o olhar dessa “Senhora” é tão belo que a vista seria o preço de admirá-lo. Apenas admirá-lo já seria motivo de satisfação para o homem. Está também presente nesse soneto a ideia de submissão do homem à mulher amada a quem o homem serve sem pedir nada em troca, o desejo de estar próximo mesmo que apenas para admirá-la, mesmo que ela não saiba que ele a ama, e mesmo que ela não corresponda. Esse soneto […] traz o ideal de Amor platónico que coloca a mulher como um ser iluminado que leva o homem a atingir o seu ideal de felicidade por meio do amor espiritual.»
«o Amor é representado em
Camões de diversas maneiras: no Amor contraditório,
marcado pelo uso das antíteses e pelo ideal racionalista da universalidade; nas
conceções de Amor platónico e
de Amor cortês, marcados pela
idealização da mulher como ser divino que serve
de ponte para que o homem alcance a completude da alma por meio do Amor puro; e no Amor carnal em oposição a
esses primeiros, mostrando que mesmo que o homem
deseje esse Amor espiritual, ele também deseja ver a sua amada corporalmente, contradição
essa marcada pela própria experiência
amorosa de Camões. […] Por fim, entendemos que essas várias faces do amor em
Camões não aparecem exatamente separadas umas das outras; é possível notar uma mescla de mais de uma
conceção nos seus poemas,
causando essa contradição tão presente no homem renascentista.»
Azevedo, Marcos
Paulo; Silva, M. J. Rodrigues, A
REPRESENTAÇÃO DO AMOR NA LÍRICA CAMONIANA(com cortes)
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