terça-feira, 21 de maio de 2019

Livros de Luís Cardoso

Luís Cardoso de Noronha nasceu em Timor. Licenciou-se em Silvicultura pelo Instituto Superior de Agronomia de Lisboa. Tem uma pós-graduação em Direito e Política do Ambiente pela universidade Lusófona. Foi o representante do Conselho Nacional para a Resistência Maubere em Lisboa.
Crónica de uma travessia é um livro de carácter autobiográfico, editado pela primeira vez em 1997. Outros livros: Olhos de Coruja, Olhos de Gato Bravo (2002), A última Morte do Coronel Santiago (2003) e Requiem para um Navegador Solitário (2007) e O ano em que Pigafetta completou a circum-navegação (2013).


"O livro Crónica de uma travessia [tem] características biográficas por nele estarem presentes as marcas dos lugares, das pessoas que os habitam e marcaram de alguma forma a memória do autor, como a vida na aldeia onde cresceu, os périplos realizados com o pai, enfermeiro de profissão e, mais tarde, prisioneiro de guerra na ilha de Atauro. A tudo isto, junta-se o exílio contado na primeira pessoa pelo narrador, que retrata os tempos de juventude em plena década de 1970, depois de concluir o ensino secundário e ingressar no Ensino Superior em Portugal.
[...]
Um dos aspectos mais fascinantes do livro consiste na descrição das tradições religiosas do povo maubere, do sistema de crenças local, assente num sincretismo religioso, resultante da presença portuguesa na região e influência do catolicismo, de onde brota uma fusão de elementos das religiões antigas com elementos do cristianismo, introduzidos pelos missionários Jesuítas.

Outra questão amplamente debatida no romance é o acesso à educação e ao emprego pelos habitantes de Timor durante o Estado Novo, uma época em que o tipo de ensino a seguir pela criança era previamente determinado consoante o estrato social, à semelhança do que acontecia o território continental.

«O liceu era um local muito selectivo onde estudavam os filhos das altas autoridades europeias, que chegavam de manhã com sono, nos carros oficiais, e eram acordados nas aulas pelas professoras, esposas de súbditos e subalternos: “O menino Pedro dormiu mal?”. Os filhos dos funcionários menores e colonos que chegavam nos seus carros particulares: “Pedro, cale-se!” (…) e os filhos dos funcionários nativos: “número 77, ou te calas ou rua!”».


«Face ao grande insucesso escolar e à falta de saídas profissionais, foi instaurada uma escola técnica com o nome do então Ministro do Ultramar, Silva Cunha. Um edifício moderno, que me lembrava um pombal, e acolhia um numeroso contingente de jovens timorenses, maioritariamente oriundos do interior. Procuravam uma informação técnica e rápida que desse acesso a um emprego.»

O que salta à vista em Crónica de uma Travessia é uma de sociedade extremamente estratificada e a quase inexistência de mobilidade social. A própria descrição das zonas mais rurais de Timor, que, como sabemos, era na altura era uma colónia portuguesa, em pouco difere das descrições dadas pelas pessoas mais antigas em Portugal daquilo que era a sociedade do Estado Novo no continente."

Créditos: blogue Há sempre um Livro -  https://hasempreumlivro.blogspot.com/2013/11/cronica-de-uma-travessia-epoca-dos-ai.html

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