O Título
FFMS. (2017). Retrato de Portugal na Europa. Lisboa: PORDATA.
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Republico edição anterior, para refrescar a memória.
Eça no EXAME - PROVA 639 - FASE 1 - 2020
Podem e devem revisitar os interessantes e úteis textos de comparação entre A Ilustre Casa... e Os Maias que colegas vossos fizeram em abril/20, por exemplo:
Eça de Queirós: dois romances, dois protagonistas ( M. Matias)
Republico a edição de dezembro, para refrescar a memória.
Gonçalo Mendes Ramires (Eça de Queirós, A ILUSTRE CASA DE RAMIRES)
Personagem central do romance semipóstumo de Eça de Queirós, A ilustre casa de Ramires (1900). Para além de ser conhecido pelo nome próprio, Gonçalo é designado também, “naquela sua velha aldeia de Santa Ireneia, e na vila vizinha, a asseada e vistosa Vila Clara, e mesmo na cidade, em Oliveira, (…) [como] «Fidalgo da Torre»” (Queirós, 1999: 73). Remete-se, deste modo, logo no incipit, para um determinado espaço e para uma condição social confirmada na caracterização inicial.
Nela, o discurso do narrador começa por atentar na personagem, mas desloca-se de imediato para dois campos que lhe estão associados: a família e a História em que ela se inscreve. Assim, “Gonçalo Mendes Ramires (como confessava esse severo genealogista, o morgado de Cidadelhe) era certamente o mais genuíno e antigo fidalgo de Portugal” (74). Logo depois, recorre-se a um dispositivo de figuração usual na ficção queirosiana, a analepse: “Raras famílias, mesmo coevas, poderiam traçar a sua ascendência, por linha varonil e sempre pura, até aos vagos senhores que entre Douro e Minho mantinham castelo e terra murada, quando os barões francos desceram, com pendão e caldeira, na hoste do Borguinhão” (74).
Depois disto, o narrador centra-se na família e descreve os feitos dos Ramires, “em cada lance forte da História de Portugal” (74), particularizando quatro etapas históricas: a da independência e consolidação do Reino, a da expansão, a dos Filipes e a da Restauração, com os Braganças, quando se anuncia a decadência: “Já, porém, como a nação, degenera a nobre raça…” (76). Por fim, chega-se ao protagonista: “Gonçalo, esse, era bacharel formado com um R no terceiro ano” (77).
A partir daqui, a personagem é configurada em função de comportamentos. Nessa “figuração poliédrica”, “é através do que Gonçalo vê, faz, diz, pensa e até sonha que vai ganhando um vulto ficcional onde o riso, mas também a complacência e até a ternura, estão muito presentes” (Monteiro, 2014: 24). Outros traços de caracterização: a ociosidade e a inércia, uma certa debilidade anímica, em contraste com os Ramires do passado, o apelo da temática histórica, traduzido na composição de um conto com “final choroso” (78), a abulia cortada por assomos de generosidade e de chamamento para a escrita.
A escrita da novela constitui um domínio decisivo para a figuração da personagem, por três razões. Primeiro, porque, ao longo desse processo, Gonçalo evolui, repensa a sua vida e o seu legado histórico, com efeitos na interação com as restantes personagens (veja-se a crescente tomada de consciência de um poder simbólico provindo do passado, relativamente ao poder político representado por André Cavaleiro). Segundo, porque a escrita da novela desencadeia reflexões acerca desse processo propriamente dito, enquanto trabalho e técnica (o tratamento das fontes, o trauma do plágio, o árduo labor estilístico, a expectativa da receção pelo público, etc.; cf. Reis, 1999: 181-183), tudo isto conferindo à escrita o poder de transformar quem a empreende (cf. Bittencourt, 2017: 222-228). Terceiro, porque o passado que emerge da “Torre de D. Ramires” deixa de ser uma mera evocação literária; progressivamente, esse passado interpela Gonçalo e o seu tempo, no tocante a uma certa falência de valores, na vida de um fidalgo em crise e de uma família em decadência.
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Carlos da Maia (Eça de Queirós, Os Maias)
Carlos Eduardo da Maia é uma das figuras centrais d’Os Maias (1888), sendo filho de Pedro da Maia e de Maria Monforte e neto de Afonso da Maia e de Maria Eduarda Runa. À exceção da educação de matriz britânica, dirigida pelo avô e representada no capítulo III do romance, Carlos protagoniza o percurso do jovem português rico e de origem aristocrática, na segunda metade do século XIX: estudos em Coimbra, viagem pelo estrangeiro, vida em Lisboa com vagos projetos de trabalho, dispersão de interesses, presença regular em episódios sociais e ociosidade generalizada. Em termos cronológicos, o trajeto da personagem, na ação do romance e na história da família Maia, situa-se sobretudo nos anos de 1875 a 1877, com um regresso em 1887, correspondendo ao epílogo do relato.
Na Lisboa romântica e culturalmente medíocre daqueles cerca de dois anos, Carlos da Maia destaca-se pela sofisticação do gosto. Descrito como uma figura elegante, de ar saudável, com barba castanha, cabelos negros e os olhos dos Maias, Carlos lembra um “belo cavaleiro da Renascença” (Queirós, 2017: 143); a isto junta-se um comportamento marcado pela inconstância e pelo diletantismo, em harmonia com a propensão esteticista que se projeta na decoração da casa do Ramalhete. Essa decoração inclui opções de gosto que explicam a reação do procurador da família: “Os recostos acolchoados, a seda que forrava as paredes, faziam dizer ao Vilaça que aquilo não eram aposentos de médico — mas de dançarina!” (65). No começo da vida adulta, os propósitos pessoais de Carlos pareciam indicar que ele viria a concretizar as expectativas do avô e aquilo para o que a sua formação o preparara; no entanto, vai-se gradualmente revelando a incapacidade para qualquer compromisso produtivo, desde a profissão de médico até aos projetos culturais. E assim, Carlos “ocupava‑se sempre dos seus cavalos, do seu luxo, do seu bric‑à‑brac”, invariavelmente cultivando aquela “fatal dispersão de curiosidade que, no meio do caso mais interessante de patologia, lhe fazia voltar a cabeça, se ouvia falar duma estátua ou dum poeta” (173).
No plano pessoal e, em particular, no campo sentimental, Carlos não consegue manter uma relação estável. A comparação com D. Juan, feita de forma casual por João da Ega, encerra, afinal, um sentido premonitório: “Tu és simplesmente, como ele, um devasso; e hás de vir a acabar desgraçadamente como ele, numa tragédia infernal!” (195). Assim, é significativo que a relação amorosa com Maria Eduarda (a única que parecia duradoura) se revele impossível e destrutiva, pondo em causa a continuidade da família. Vários elementos devem ser destacados nesta relação, dentre eles o olhar de Carlos e a forma como ele molda a figura e a personalidade de Maria Eduarda; o que esse olhar absorvente e possessivo retém são cores, formas e movimentos, conformando a imagem de uma mulher que surge a Carlos “com uma carnação ebúrnea, bela como uma deusa, num casaco de veludo branco de Génova” (224). A intensidade com que Carlos vive um amor que exige a fuga dos amantes (afinal não consumada) e o desgosto do avô revela um egoísmo com consequências extremas: depois de conhecer o laço familiar que o une a Maria Eduarda, Carlos mantém a relação incestuosa por um breve tempo, resultando dessa fraqueza moral duas vítimas, a irmã e o avô. Em relação a ele próprio, confirma-se um destino de fracasso, já anunciado no plano profissional e acentuado pela falência moral que atinge a personagem e o que resta da família dos Maias. Confirma-se, por fim, o estigma de perdição que fora sugerido por “aqueles irresistíveis olhos do pai” (143), na breve caracterização já mencionada.
LER ARTIGO COMPLETO em Dicionário de Personagens de Eça de Queirós
Republico a edição de 17 de dezembro, para refrescar a memória.
"OS MAIAS", de EÇA DE QUEIRÓS
Os Maias constituem um texto-charneira na evolução estilística e ideológica de Eça, operando a consolidação da passagem entre o período revolucionário naturalista da década de 70 e o da década de 90, de inspiração humanista. A expressão «humanismo» significa aqui o ponto de vista de um autor que planeia colocar-se epistemologicamente acima dos grupos sociais em contenda, dos interesses conjunturais da sociedade, visando abarcar a Sociedade e a História como um todo, uma espécie de olhar majestático por que conclui que o que acontece atualmente já de modo semelhante acontecera em outras épocas (tempo) e em outras sociedades (espaço). Assim, o humanismo conduz, normalmente, a um certo relativismo comparativista entre épocas e sociedades diferentes e este relativismo conduz, por sua vez, a um certo ceticismo, que serão justamente o relativismo e o ceticismo presentes n’Os Maias.
Assim, neste romance, Eça recobre tanto o processo realista de construção literária quanto o processo humanista de observação social. Trata-se de, retratando os grupos sociais afrancesados pós-Regeneração e a sociedade lisboeta fontista, denunciar igualmente os aleijões sociais da mentalidade portuguesa finissecular oitocentista, evidenciando geneticamente os efeitos de uma educação europeia (Carlos da Maia) comparativamente com os efeitos de uma educação monárquica tradicional (Afonso da Maia) e de uma educação burguesa portuguesa.
Se Eça, quando começou a escrever Os Maias, ainda era realista, quando o findou já assumia a pele de um humanista que contemplava a sociedade portuguesa do século XIX (as três gerações da família Maia) do ponto de vista da totalidade da sua experiência como jovem romântico (década de 1860), como participante numa intervenção social no sentido da transformação da mentalidade cultural de Portugal (Geração de 70), como feroz crítico de costumes (As Farpas, escritas com Ramalho Ortigão), e, agora, como observador crítico e reprovador da evolução da sua própria geração enquanto motor de uma revolução cultural nos costumes e na mentalidade dos portugueses («Falhámos a vida, menino!», diz Carlos da Maia para Ega). Assim, Os Maias constitui-se como um romance profundamente cético, tão cético quanto o pode ser um romance humanista, isto é, um romance que não disfarça nem cala os defeitos e as virtudes do homem, neste caso, do homem urbano português do século XIX, defeitos para os quais ao romancista já lhe falta a vontade de regeneração, e virtudes que sempre sabem a compensações.
Escrevendo Os Maias, Eça problematiza setenta anos de liberalismo constitucional, evidenciando, a partir de um olhar francês, tanto o progresso civilizacional existente em Portugal quanto a vacuidade das elites políticas e intelectuais. Neste sentido, sob a história de amor incestuosa entre Carlos e Maria Eduarda, a maioria dos capítulos d`Os Maias e a maioria das personagens encerram uma lição sobre os momentos da história contemporânea de Portugal, mas em nenhum capítulo, como em nenhuma personagem, Eça propõe uma lição dogmática, definitiva ou exclusiva sobre o futuro de Portugal – é esta a lição do novo humanismo crítico de Eça, a certeza de que Portugal, monárquico ou republicano, pobre ou rico, moderno ou arcaico, dura (como escreve em 1890).
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Imagem: fotograma do filme Os Maias, de João Botelho
Jo
Escritor João Reis no Auditório da Escola Secundária Henriques Nogueira
21 de março de 2023,14h30
Turmas 11º A, B e D
https://www.joaoreisautor.com/
https://www.instagram.com/joaoreis.author/
Podcast sobre CADERNOS DA ÁGUA -entrevista com o escritor
https://www.publico.pt/2022/10/06/azul/noticia/cadernos-agua-distopia-climatica-joao-reis-2022762
«A obra oferece-nos uma janela para um mundo distópico, assolado pela seca hidrológica, pelas guerras da água e pelo rescaldo de uma pandemia. Ao longo das 248 páginas do livro, encontramos um Portugal desidratado, que perdeu soberania, obrigando uma grande fatia da população a transformar-se em refugiados climáticos no Norte da Europa. Um texto que se situa num futuro mais próximo e menos auspicioso do que gostaríamos.
Há cerca de duas semanas, o Azul publicava uma notícia intitulada “Chegou o Outono e o conflito da água com a Espanha está à vista”. Num dos comentários deste texto, que discorre sobre a disputa ibérica pelo acesso à água dos rios internacionais, um leitor escreveu: “Está tudo descrito nos Cadernos da Água, de João Reis”. Mas o autor do romance não ficou nada surpreendido por ter imaginado um mundo que, agora, as pessoas reconhecem nas páginas dos jornais.
“É um livro de ficção especulativa, não é um presságio. Não sou vidente. Mas é uma forma de reflectirmos sobre um futuro [sem água]. As personagens são ficcionais mas baseei-me em factos científicos e políticos que têm sido noticiados. Muitos deles passam despercebidos pela maioria da população - e talvez seja por isso que as pessoas ficam surpreendidas”, afirmou o autor neste episódio.
O autor de Cadernos da Água estudou Medicina Veterinária, mas acabou por licenciar-se em Filosofia. Além de escritor, João Reis já desempenhou diversos ofícios em Portugal e nos países para onde emigrou. Foi cozinheiro na Noruega e na Suécia e ajudante num armazém de vinhos na Inglaterra. Fundou a editora Eucleia, em 2010, ao lado da irmã, projecto editorial pelo qual foi responsável até 2012. Fala seis línguas. Hoje, dedica-se inteiramente à escrita e à tradução.»
«Um jovem autor português instala-se numa residência para escritores em
Seul para escrever o seu próximo romance. Em vez disso, deambula pela
cidade com a namorada, possivelmente grávida, e entrega-se a todo o tipo
de fait divers mais ou menos absurdos, não obstante a pressão dos
editores. (...)
Ao deixar-se levar pelo fluxo dos acontecimentos, detendo-se obsessivamente num e noutro pormenor irrelevante, Rodrigo encarna o protótipo do anti-herói desencantado e imperfeito, derrotado à partida pela ficção da vida. Se com Pétalas ou Ossos retoma a ideia iniciada com o seu primeiro livro, A Noiva do Tradutor, levando-a ao paroxismo, para lá do qual a inércia se confunde com a redenção.»
Gil Vicente, figura insigne do Teatro e das Letras portuguesas, de vida incerta e misteriosa, e alvo de admiração e honrarias ao longo dos séculos. Menos afamado, talvez, seja seu servo, Anrique de Viena, homem humilde e leal que conheceu em batalha o mundo, e que regressou para o lado de seu senhor para o acompanhar no inverno de sua vida e o ajudar na escrita da sua última peça. E através da pena de Anrique, ágil e dedicada, veremos o mestre como nunca antes foi visto: completa e profundamente humano.
Irónico, divertido e comovente, Quando Servi Gil Vicente é um exercício extraordinário de estilo e invenção que, prestando homenagem a um dos maiores autores portugueses, nos permite acesso ao que, para o bem e para o mal, poderia ser Gil Vicente no seu tempo e mundo.
https://www.penguinlivros.pt/loja/elsinore/livro/quando-servi-gil-vicente/
«A noite levava-nos a pensar, a imaginar comida, a nossa casa,
mais comida, terríveis cenas de infância, essa época
abominável, misturavam-se com imagens de comida e
exponenciavam o nosso suplício (…) tornava-se incomodativo
e alguns choravam, para em seguida se rirem. Terminadas as
lamúrias, tudo corria melhor, fazia-se silêncio, podia-se
dormir.»
A Grande Guerra assola a Europa do início do século XX. Um
capitão do Corpo Expedicionário Português encontra-se num
campo de prisioneiros alemão, sem documentos que atestem a
sua patente de oficial, obrigado a partilhar a vida e o destino dos
seus conterrâneos mais pobres. Tem fome, ouve detonações
constantes, observa, sonha, procura um sentido para tudo aquilo
que o rodeia, tenta terminar o relato de uma estranha história
sobre cientistas alemães e gravações de voz, procura
desesperadamente o silêncio e, acima de tudo, a paz das coisas
simples.
https://www.wook.pt/livro/a-devastacao-do-silencio-joao-reis/21717317
«As folhas caídas das árvores giram à minha volta com o vento, mas aperto mais o casaco, porque nem o vento nem as folhas- -bailarinas me alegram com a melancolia, só me deixam ensopado em tristeza, como a chuva nos faz por vezes. Os homens não choram. Avanço. Os catos que vejo alinhados na rua voltam a ser árvores e a Babushka, deitada na cama de hospital, é uma criança que aumentou e encolheu.»
Babushka está doente. Esta russa idosa, emigrante no Canadá, sobreviveu ao acidente nuclear de Chernobyl. Esconde no peito a doença que a obriga a respirar a contratempo e lhe impõe uma tosse longa e larga e comprida e sem fim — um mal que a faz viver mergulhada nas memórias do seu passado luminoso, a neve pura da Rússia, recordação sob recordação.
Na fronteira com a realidade caminha o seu neto mais novo, de dez anos, um menino que não desiste de puxar o fio à meada e de tentar devolver a avó ao presente. Para ajudar Babushka, precisa de encontrar uma solução para os seus pulmões destruídos, sacos rasgados e quase vazios — mesmo que isso o obrigue a crescer de repente e partir em busca de uma planta milagrosa, o segredo que poderá salvar a família e completar a matriosca que só ele vê.
Narrado na primeira pessoa e escrito a partir da perspetiva de uma criança, "A Avó e a Neve Russa" é um livro feito da inocência e da coragem com que se veste o deslumbramento das infâncias.
https://www.fnac.pt/A-Avo-e-a-Neve-Russa-Joao-Reis/a1015683